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Viajar é preciso.

 

Com toda a tecnologia que hoje dispomos, comodamente passamos do bairro em que vivemos para qualquer outro lugar no planeta, basta apenas um computador. Acessamos um mapa via satélite, damos um zoom poderoso capaz de transformar um amontoado de pixels em qualquer escala que necessitemos, e pronto. Rapidamente podemos visitar uma cidade inteira, e conhece-la em detalhes através de imagens e informações vistas a partir do céu.

Porém, nada mais abstrato. Nada menos realista. Uma imagem de satélite nos permite perceber uma cidade e toda sua região, mas decompõe-se em múltiplos écrans no momento em que descemos a terra.

Para conhecer de fato é preciso deslocar-se fora da tela. É preciso viajar. Só assim se aprende verdadeiramente a conhecer um lugar, pois é através da visão subjetiva, personalizada e individualizada que fazemos nossa própria compreensão do lugar. É no somatório das dimensões geográficas, simbólicas, emocionais, culturais, políticas, biológicas e religiosas que criamos uma relação de afetividade com o lugar e lhe damos identidade e significado.

Por isso, sempre que viajo procuro observar tudo aquilo que tenha importância no campo simbólico de cada lugar. Observar a arquitetura como arte e o cotidiano das pessoas, me ajuda a compreender melhor o papel do homem como agente responsável pela formação do ambiente construído ao seu entorno, bem como a complexidade das relações sociais e seus conceitos e valores. São os manifestos da consciência coletiva. A deliciosa experiência de estarmos juntos trocando ideias e conhecimento a cerca de tudo que resume e caracteriza o lugar.

Em 2016, depois de visitar a Patagônia Argentina, iniciei uma série de outras viagens. E descobri que viajar é uma arte, já que o viajante precisa de tempo e treino para desligar seu olhar estrangeiro e aceitar que isso é condição fundamental para ampliar as possibilidades de gostar do que vê.

Por ano milhões de pessoas entram num avião e atravessam meio planeta para conhecerem outros lugares. E o que nos move? Por que viajamos tanto? Jamais foi um mistério para mim. Viajo porque sou curiosa e inquieta. Porque sempre descubro um pouco mais de alguma coisa. Porque sempre aprendo muito sobre outras tanto. E porque sempre encontro algo mais em todas as coisas. E assim foi. Em alguns lugares vivi uma conexão tão incrível, que quase pude sentir uma espécie de elo sagrado entre nós.

E num mundo de supérfluos e filtros que maquiam imperfeições, felizes são os que possuem um senso estético diferenciado capaz de ver pessoas, e não apenas adereços para uma foto. Pessoas que possuem sensibilidade e compaixão para ver tudo aquilo que temos tendência a esquecer, e nos fazem perceber como relatos alheios e leituras, muitas vezes são completamente equivocados.

 

Denise Oliveda

 

 

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