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Patagonia Argentina, meu lugar no mundo.

 

Desde que cheguei à Argentina, - e lá se vão quase oito anos -, sonhava em conhecer a Patagônia, região de aproximadamente 930 mil quilômetros quadrados que abrange uma vasta área no extremo sul do país, mas que também possui uma pequena extensão além da fronteira com o Chile.

Caracterizada pelo clima frio, baixas temperaturas, nevadas, glaciares espetaculares e majestosas montanhas, a região é conhecida e muito procurada justamente por essas incríveis paisagens. Mas também há pelo caminho muitas planícies áridas, pastagens e desertos, cenário desconhecido para a maioria, pois somente desfruta dessa paisagem quem decide se aventurar de carro.

E foi o que fizemos. Iniciamos nossa viagem no dia 04 de janeiro de 2016, partindo de Buenos Aires, a bordo de um confortável Toyota Corolla. E quanto mais nos afastávamos de Buenos Aires, mais fascinada eu ficava com as paisagens panorâmicas. Ora eram grandes desertos, ora uma natureza exuberante e sedutora. E essa alteridade fascinante de cenário me arrebatava.

A Patagônia é um universo em si que precisa ser visto, admirado e respeitado com tudo aquilo que comporta.

Cada movimento, cada nova paisagem que se descortinava me chegava carregado de significados silenciosos. Tudo era tão familiar, apesar de nunca haver estado. A contemplação silenciosa e a força da natureza me remeteram aos fragmentos de conversas que ainda sobreviviam a minha memória. Conversas que tive com meu avô Benjamin quando criança, e que naquele momento moveram em mim, em grande medida, passagens lindas da minha infância, quando ele me contava e relatava suas andanças por esses mesmos lugares quando jovem.

E diante da exuberância dos Andes, dos lagos verde esmeralda, das amplas paisagens e excessiva luminosidade, pude sentir a força daquelas narrativas sempre tão carregadas de emoção e saudade de seu país natal, amigos e familiares que haviam ficado pata trás. E era incrível como o cenário ia impregnando o espírito de meu avô por onde passávamos.

Talvez porque “lugar” é definido como parte delimitada de um espaço no qual o individuo desenvolve para com ele relação de identidade, afetividade e bem estar. Um vínculo emocional de vivências e sentimentos onde se constroem laços importantes.

Sendo assim, naquele momento era a memória quem dava o tom, enfatizando a necessidade de reavivar os melhores momentos da minha infância, boa parte transcorrida na companhia e narrativas de meu avô. Memórias preservadas como pequenos tesouros guardados por uma criança. Um retrato do vivido. Uma reconfortante e terna viagem pelos recônditos lugares da infância de meu avô, e tudo o que escolheu não deixar perecer.

Aquela viagem a Patagônia Argentina, serviu para recriar, filtrar através de lampejos de memória uma gama infinita de curtas e densas histórias que me chegaram como nítidos flashes poéticos de um tempo e lugar. Meu avô era sem dúvida um grande narrador. Suas narrativas eram construídas como quem constrói portas e janelas, permitindo visões e passagens abertas para que eu sempre pudesse atravessar e entrar. Sentir-me parte de todas aquelas representações do passado, às vezes imprecisas, certamente, outras criadas entre verdades e invenções. E assim, sem saber, me ensinou a amar a Patagônia.  E esse, sem dúvida é meu lugar no mundo.

 

Denise Kirsch Oliveda

 

Comentários

  1. Eu tive o privilégio de ver suas fotos e, assim, me encantar com a Patagônia como agora me encanto com seu texto, especialmente com o final, com os flashes das memórias de seu avô fundindo-se às suas a ponto de levá-la à conclusão de que a definição de lugar não pode desconsiderar o "vínculo emocional de vivências e sentimentos onde se constroem laços importantes". Amei!

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  2. Muito obrigada Jussara, sua presença aqui no blog me deixa sempre muito feliz.

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