Quando em outubro de 2015, ainda no Uruguai, considerei a
possiblidade de viver em Buenos Aires, duas forças muito claras me
impulsionavam, e as duas tinham raízes em emoções contrárias: alegria e medo. O que é compreensível, porque, para além de toda a sedução que possa
haver no contexto que envolve uma vida que está por inaugurar-se, há também uma
vida que, até então, não existia.
O projeto levou apenas um mês para se tornar realidade e concretou-se, de fato, em três dias, o tempo necessário para arrumar as malas e viajar.
É curiosa a capacidade do ser humano de adaptar-se ao meio, às pessoas
e situações. Estava em Buenos Aires há poucos dias mas já conseguia estabelecer
uma rotina diária, movendo-me pelo entorno com muita intimidade.
E foi com muitas sensações no peito e ideias na cabeça que dei inicio ao meu projeto. E sabe quando você se depara com algo tão bom e interessante que se pergunta: “Por que não pensei nisso antes?”
Só que nem sempre é fácil lidar com tantas mudanças. No começo assusta. Deixa aquela sensação desagradável de se sentir um pouco partida entre culturas, idioma, costumes e tantas outras coisas. Sem contar que é preciso reorganizar tudo, desde os novos espaços a relações.
Troca-se amigos, idioma, arquitetura, paisagens, histórias,
mitos, ritos, árvores, insetos, animais, comidas, costumes, gírias, voltagem e inclusive, até o cabelo. Sim, porque em muitos lugares a água
é um horror para o cabelo.
Desde cedo percebi que sou uma mulher de muitas culturas. De menina desfrutava os benefícios de três culturas próprias, com suas respectivas miscigenações e idiossincrasias, com idiomas distintos e imaginários diferentes. Habitava numa casa onde se praticava o português e alemão como idiomas, e, em outra, o espanhol. Para mim era perturbador, mas eu aceitei com naturalidade. E foi com essa mesma naturalidade que abracei as dores e delicias de viver em Buenos Aires, uma cidade viva, feita de mundos inteiros que estão ocultos por trás das cascas das coisas, das aparências das pessoas e da consciência quotidiana comum.
Ter percorrido diversos lugares e compreendido diferentes formas de enxergar o mundo, faz com que eu me sinta em casa, não só aqui, mas em qualquer lugar, porque o meu lar sou eu, e o carrego comigo aonde for.
Inquilina
desse "hermoso" país, hoje já não
sinto mais a nostalgia pelo que foi deixado, como as referências do que conhecia
como segurança e estabilidade, por exemplo.
Aí me dou conta do larguíssimo caminho recorrido até aqui. Vivi tantas coisas desde os meus primeiros passos, iniciados naquela manhã, dia primeiro de janeiro de 2015, quando rompi definitivamente com todas as comodidades e deixei para trás o que conhecia como casa. Foram experiências valiosíssimas, tanto que sinto como se levasse vividas muitas vidas nos últimos cinco anos. E tem sido um prazer absoluto descortinar as novas possibilidades e descobertas dessa nova morada.
Embora, ainda me assuma vulnerável em alguns aspectos, por outro lado, é com certa arrogância que assumo e acolho a fé em mim mesma. Fé que credito a todos aqueles que, em parte, e com extrema competência passaram por minha vida deixando-me com a horrível sensação de que há muito mais distancias em mim, do que elos. A estas pessoas dedico a responsabilidade por tornar-me quem sou, e os agradeço profundamente.
Denise Oliveda
"... o meu lar sou eu, e o carrego aonde for." Que grande e maravilhosa verdade, Denise! Principalmente quando se é, como você, uma grande viajante :)
ResponderExcluirNão sei a razão, mas acreditava que você fosse natural de Buenos Aires...
Abraço!
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